No caso dos Foals, é caso
para dizer que à terceira foi de vez. Após dois (bons) discos com muita sede de
experimentação e desejo de procura, a banda britânica conseguiu, com a edição
de “Holy Fire”, a sua melhor rodela sonora até à data. Um disco afiado,
grandioso e emotivo, que cruza a pop
e o rock com muito glamour e convida,
também, ao abanar de anca. Vê-lo nas habituais listas de final do ano não será,
portanto, de estranhar.
No concerto de ontem, porém, os Foals não se limitaram a apresentar
“Holy Fire” de uma ponta à outra, optando por revisitar uma carreira que começa,
agora, a ganhar estatuto. E fizeram-no de forma irrepreensível, numa actuação a
cozer em lume brando que terminou de forma apoteótica, apenas pecando pela
curta duração (não chegou a bater a hora e meia). Ajudada por um jogo de luzes de
proporções cinemáticas, a banda iniciou com “Prelude” o seu desfile sonoro, não
esquecendo o “Boa noite Lisboa” da praxe.
«Total Life Forever», tema título do segundo disco, revelou a paixão
que a banda nutre pelas raízes reggae,
tratando de as regar de modo acelerado para que a colheita se faça jogando na
antecipação; «Olympic Airways», do excitante disco de estreia, é o que se pode
chamar de fase Bloc Party em modo de alarme silencioso, com guitarras
ululantes, coros bem medidos e um kick
de bateria capaz de incendiar uma pista de dança meio adormecida; «My Number» é
pop/rock em estado de graça, o tema
mais dançável de “Holy Fire”, que provocou o primeiro acordar das hostes; «Blue
Blood» é o exemplo perfeito do estilo agridoce da banda, que começa por
convidar a dançar um slow apertado para,
às tantas, conduzir toda a gente à dança desenfreada impelida por uma malha de
baixo saltitante e guitarras que se ouvem como um eco em loop; em «Providence»,Yannis Philippakis chega-se à frente e mostra
uma voz irrepreensível, aproveitando o élan
para descer até junto das grades e medir a temperatura das filas da frente;
«Late Night», muito provavelmente o momento alto de “Holy Fire”, foi um
festival a nível vocal e instrumental, abrindo a porta e convidando os solos de
guitarra a entrar; “Milk & Black Spiders» foi talvez o único tema menos
conseguido, com a voz de Yannis a não devolver ao vivo todas as tonalidades
impressas na versão de estúdio; «Spanish Sahara», a grande malha de “Totally
Life Forever”, só não foi mais brilhante pelas palmas fora de ritmo que
quiseram acompanhar o crescendo da música, retirando-lhe parte da beleza e da
melancolia. Afinal, no deserto não se querem palmas (nem telemóveis ao ar),
apenas contemplação; o primeiro acto fechou em grande com «Red Socks Pugie»,
com os amplificadores a quase a darem de si e Yannis a decidir-se por uma
incursão entre o público, para desespero o segurança que ia afastando braços
como moscas inoportunas. “Oh
hell, no these vessels |Our heart swells up these vessels |Our heart swells up
which make us explode”, cantava-se animadamente entre saltos na vertical.
O encore fez-se ao sabor de
«Inhaler», onde Yannis aproveitou para agradecer com os «fuck» e os «amazing»
habituais e, também, de «Two Steps, Twice», momento em que a bola de espelhos
fez das suas e ofereceu um momento visual impressionante, como se do céu caíssem
flocos de neve e, movidos por um som hipnótico e tribal, todos dançassem à
volta de uma fogueira imaginária, sonhando com estar perdidos de amor e
felicidade nos confins de uma floresta esquecida. Bem se cantou “Babada babada,
babada baba” a pedir o regresso dos Foals ao palco mas, depois de um final
destes, furioso e comovente, ninguém terá saído do Coliseu desapontado. Grande
noite para os britânicos que já terão, certamente, passagem marcada para um dos
muitos festivais lusitanos de 2014.
Data: 2013-10-29
Fotografia: Pedro Figueiredo
Texto: Pedro Miguel Silva
Texto: Pedro Miguel Silva