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ENTREVISTA: LUÍSA SOBRAL " GANHEI MAIS CONFIANÇA EM MIM E NAS MINHAS DECISÕES MUSICAIS"


"Ganhei mais confiança em mim e nas minhas decisões musicais" (Luísa Sobral)
Na antevisão do concerto que se aproxima no EdpCoolJazz, já no próximo dia 4 de Julho, o My Sound esteve à conversa com Luísa Sobral e falamos sobre o seu novo trabalho.


My Sound: “The Cherry on my Cake” apresentou-nos uma menina doce e, arriscamos dizer, um pouco tímida, mas que com a sua voz marcou desde cedo uma presença importante no panorama da música nacional. O que mudou desde o teu álbum de estreia para o mais recente “There’s a Flower in my Bedroom”?

Luísa Sobral: Mudaram dois anos, cresci! As canções já não têm tanto aquele lado tão infantil, queria uma coisa mais verdadeira, mais terra a terra, não sei bem explicar. As letras são mais profundas é menos autobiográfico, tem mais histórias.

MS: Dos próprios nomes dos álbuns às letras das canções a tua música reflete um ambiente ligado à fantasia, sentes que a mensagem que queres transmitir chega mais longe se for contada através de histórias?
LS: Eu não penso muito nisso, vou escrevendo como me apetece e muitas vezes saem histórias, porque eu gosto muito de ler e da ideia de contar histórias a outras pessoas, imaginar outras vidas.  Não acho que com isso chego mais longe, porque tanto com algo mais autobiográfico como com uma história se pode chegar às pessoas, desde que seja algo com que eles se identifiquem. Por isso não é uma coisa muito pensada, vai saindo naturalmente quer seja uma história minha, como uma história de outra pessoa.

MS: A guitarra tem sido uma grande companheira é com ela que vais compondo as canções? Como encaras todo o processo criativo?
LS: Encaro com muita naturalidade, eu gosto muito de tocar guitarra (gostava de tocar melhor), mas gosto muito de tocar guitarra. Para mim a composição é muito natural, estou em casa e tenho vontade de tocar guitarra e começa a sair uma frase que me dá uma ideia e fico com essa frase e com essa ideia e acabo por compor uma canção assim sem ter noção do tempo. Às vezes acabo por ficar horas e esqueço-me de tudo, até de comer.
Gosto de compor, mas não vou ficar em casa para compor, faço isso quando as pessoas me pedem músicas e nesse caso tenho de me forçar um bocadinho e digo “Hoje tem de ser um dia de composição”, mas normalmente é uma coisa bastante natural. Não paro para compor, paro as vezes para tocar, mas também sem obrigação, vou tocar porque me apetece. A guitarra está ali ao lado e tenho vontade e começo a tocar uma música qualquer que até pode nem ser minha e depois a partir dai gosto de um acorde e inspiro-me nesse acorde, ou vejo uma frase que gosto e inspiro-me nessa frase. 

MS: Gostamos do resultado final do álbum, mas sabemos que até à sua conclusão foi percorrido um longo caminho, conta-nos um pouco as etapas porque passaste na elaboração de “There’s a Flower in my Bedroom”.
LS: Este disco foi composto quase todo logo a seguir a ter lançado o meu primeiro álbum, comecei logo a compor canções novas, alias algumas delas já toquei no concerto do lançamento do primeiro disco. Foram canções que eu fui escrevendo, sem pensar muito que elas fossem fazer parte de um segundo disco, ia compondo. O disco acabou por ter 17 canções, precisamente porque eu já tinha escrito tanta coisa e não sabia qual é que devia selecionar e acabei por pôr tudo.
Fui escrevendo ao longo dos dois anos a fazer a tournée de “The Cherry on my Cake” a tocar e a viajar e foram muito mais partilhadas com os músicos, porque começou a ser uma banda muito mais minha. Conhecemo-nos quando gravamos o disco e desde então já começava a escrever as canções quase com eles e a ouvi-los a eles também a tocar. Cada vez que escrevia algo novo, mandava-lhes e experimentávamos nos ensaios.
Acabou por ser algo feito mais em conjunto, e foi passando por várias fases: composição, partilha e experimentação. Os arranjos foram feitos desta vez por nós todos juntos o que para mim tornou o disco muito mais pessoal, acho que isso reflete-se também nos concertos ao vivo, é um disco nosso onde cada um pôs o seu cunho pessoal.


MS: Consideras então que isso reflete um pouco mais a tua maturidade como artista
LS: Nestes últimos dois anos ganhei um pouco mais de confiança em mim e nas minhas decisões musicais. Tinha um bocadinho de medo de dizer que gostava de experimentar coisas novas, mas agora como já conheço bem os músicos, eles também me dão confiança para tomar outras decisões. Hoje em dia já não tenho medo de experimentar nada, se soar bem soa se não soar não soa. Não sinto que tenha nada a provar e isso ajudou-me bastante. 

MS: Estivemos na apresentação no Ritz Clube, que teve direito a casa cheia, o que sentes quando vês que um novo projeto tem rapidamente uma aceitação tão favorável do público?
LS: (Até demais, eu acho) É incrível, esse concerto foi muito especial … Eu ainda não me habituei a ouvir as pessoas cantar as minhas músicas e é um bocadinho estranho, porque é uma coisa tão intima que depois ver as pessoas cantá-las… não sei! Mas é muito bom sentir que as pessoas gostam do nosso trabalho, ainda por cima de um trabalho novo, porque há sempre o receio de as pessoas não gostarem tanto como do primeiro, mas tem sido muito bom

Luísa Sobral no Ritz Clube

MS: És presença assídua nas redes sociais, oferecendo aos teus fãs novidades em primeira mão, achas essencial esta nova forma de comunicar para estares mais perto daqueles que ouvem a tua música?
LS: Sim, claro que sim, eu quero que as pessoas me conheçam enquanto artista em geral, e enquanto pessoa também, acho que faz tudo parte. Eu sou bastante seletiva nas coisas que coloco nas redes sociais, não ponho nada da minha vida pessoal, mas acho que é importante as pessoas irem conhecendo outras coisas, podemos partilhar uma música que gostamos, por exemplo.
É uma maneira ótima de mostrar o que estamos a fazer, as entrevistas que demos e onde é que vamos. É uma maneira muito boa também de nos promovermos, por isso acho que é uma ferramenta essencial hoje em dia para estar em contacto com as pessoas. Antes havia uma barreira grande entre o artista e o fã, mas hoje em dia isso já não existe, e é bom. As redes sociais servem para promover uma certa proximidade e para desmistificar a ideia de que o artista não é uma pessoa normal, somos normais e fazemos coisas normais. 

MS: Viajando um pouco no tempo, consideras que a passagem pelo programa “Idolos” influenciou o teu percurso musical? Achas que estes programas de música, que alcançam tanto sucesso tanto em Portugal como no estrangeiro, são essenciais no lançamento de novas vozes?
LS: Não, e acho que até podem ser prejudiciais. Eu sei que pode parecer um pouco mal eu estar a dizer isto, mas já o disse tantas vezes (por isso é-me indiferente). Acho que lá fora talvez, mas em Portugal não há uma atividade assim tão grande, para quando uma pessoa acaba um programa desses, tenha sucesso. Até porque Portugal não é um país de interpretes (há alguns),  não há assim tantos compositores a querer escrever para outras pessoas. Por isso é difícil quando uma pessoa acaba um programa desses e não compõe, quem é que vai compor para ela? Aqui não funciona.
Ainda por cima acho que esses programas promovem o “cantor de casamentos” aquela pessoa que consegue cantar um bocadinho de tudo, desde o jazz, hip-hop, rock, fado… Um artista tem a sua identidade musical e não tem de provar que canta bem os outros géneros, se numa pessoa não tem identidade musical então essa pessoa nunca há-de vingar. O que nós queremos num artista é algo diferente. A culpa por vezes é do próprio júri porque às vezes chegam lá pessoas com essa identidade e eles não descansam enquanto não o fazem cantar mil outras coisas para provar que sabe cantar e às tantas no fim já ninguém sabe quem é que ele é.


MS: De volta ao novo álbum, gravaste três duetos, como foi a experiência de trabalhar com António Zambujo, Mário Laginha e Jaime Cullum? 
LS: Foi espetacular, cada um foi diferente do outro. O António já é meu amigo há algum tempo e nós já cantámos esta canção à algum tempo, por isso para mim foi óbvio que o queria no meu disco. Perguntei-lhe se ele queria participar assim que pensei gravar esta canção e para mim não faria sentido se não fosse assim. Aliás eu tenho muita dificuldade de cantar esta canção ao vivo porque é difícil para mim fazê-lo em ele.
O Mário foi uma pessoa que eu conheci, acho que mais ou menos um ano antes de gravar o disco, eu já gostava muito do trabalho dele, obviamente, e senti logo uma forte ligação com ele também como pessoa. Começamos a trocar músicas e depois quando escrevi esta canção em homenagem ao Bernardo (Sassetti) por isso assim que acabei a canção pensei logo que adorava que esta canção fosse assim género Tom Waits, só com piano e cordas, e que fosse o Mário a tocar. Enviei-lhe a canção e ele disse que sim.
Com o Jamie foi diferente eu conheci-o no Cooljazz, mas foi uma coisa muito rápida, apresentámo-nos. Quando estava a preparar o álbum disse à minha editora que gostava de convidar o Jamie para cantar uma música. E foi um bocado diferente porque eu não tinha uma música perfeita para o Jamie e fui procurar nas minhas músicas qual é que eu achava que seria melhor para ele e então, enviei-lhe a canção e ele disse que sim, que queria participar. 

MS: Já te vimos em outros duetos, quem gostavas de convidar para um próximo dueto? Músico nacional e/ou internacional.
LS: Internacional eu adoraria um dia cantar com a Joni Mitchell, se fosse instrumentista seria o Brad Mehldau ou o Keith Jarrett.
Em Portugal, gostava muito de fazer qualquer coisa com a Sara Tavares, com a Ana Moura, apesar de fazer já um bocadinho pois ela canta uma canção minha, mas com a Ana é diferente como ela é minha amiga nós acabamos por fazer duetos às vezes, não saem é cá para fora… 
(MS: Será que te vamos encontrar num dueto com Ana Moura no Cool Jazz?  LS: Quem sabe?) 
Há várias pessoas, gostava de cantar com o Sérgio Godinho, não sei, há assim várias pessoas que admiro musicalmente. É um mundo pequeno e nós acabamos por conhecer muitas pessoas e tocar com elas, por isso acaba por não ser tão platónico como os estrangeiros, o que não quer dizer que não seja tão interessante, é só porque nos acabamos por nos encontrar. Como o Mário Laginha, por exemplo, podia ser um desses, mas acabei por o encontrar e acabamos por ter essa sorte de colaborar com músicos que admiramos mais facilmente. 

MS: Para concluir, há dois anos estiveste na primeira parte do concerto de Jamie Cullum no EdpCooljazz, este ano voltam os dois a figurar no cartaz, podemos esperar uma interpretação ao vivo de “She Walked Down the Aisle”? O que nos podes revelar sobre este grande concerto que se aproxima?
LS: Vai ser um concerto com algumas surpresas, vou ter um convidado (ou convidada, não sei!), vou tocar um instrumento novo, mas eu não quero contar, têm de lá ir ver …

Concerto de Luísa Sobral no EdpCoolJazz

Entrevista: Vânia Marecos e Pedro Figueiredo

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